Aquelas palavras melancólicas mexeram comigo, não sei o motivo. Identifiquei-me com a autora de tão tristes letras no papel virtual e busquei saber quem era, como era; uma necessidade até engraçada, pois também eu afundava no lodo obscuro da depressão e não havia nem sombra de umas recuperações repentinas, quem dirá entereçar-me por aquela desconhecida dos versos de ouro. Como escrevia bem aquela mulher, dizia enquanto me encantavam aqueles textos pessoais dispostos para o mundo todo ler, todos com um português impecável, invejoso, belo. Um momento de alegria tomou conta de minha mente: a dona dos adoráveis escritos era de Brasília também!
Em um famoso site de relacionamentos encontrei-a, uma mulher que me pareceu fascinante. Suas fotos remetiam meus pensamentos às mais impensadas idéias e aos mais loucos desejos. Como podia, dona de um sorriso tão belo e olhar cativante, sofrer tanto como sofria? Lembrei que o mundo é mesmo injusto e esta dúvida pareceu-me desnecessária. Ela, tão linda, tão cheia de vida, inteligente, triste; a identificação com minha pessoa foi mais que imediata! E o calor que as fotos reproduziam em mim, intenso, foi dando lugar a uma ternura sem explicação. Bem, extremamente sentimental que sou, fica fácil uma explicação plausível (!) Mais que depressa lhe deixei um recado, palavras de um puro admirador que tão encantado estava com aquelas palavras traçadas no site. Mais que depressa, como um menino bobo que não deseja perder seu brinquedo mais querido, copiei suas fotos para meu computador para poder apreciar tal beleza sem fim.
A alegria tomou conta de meu ser novamente quando, sem esperar, imaginando que desprezaria minhas palavras, respondeu meu recado agradecendo e complementando que também gostara muito dos meus textos. Entrei em êxtase silencioso diante do PC! Minha face enrubesceu diante do fato que não pude esconder a satisfação naquele momento, e nos momentos seguintes, nos dias que se seguiram.
Mantive contato com aquela mulher até o dia em que li seu convite para uma cerveja com outra amiga sua, que havia chamado a hipótese à questão. Meu chão se fez pó, parecia que meus pés não mais tocavam algo sólido e sustentador e, como sempre faço no momento em que fico contente com algo inesperado, bati uma palma bem alta! Creio que até o vizinho do andar de cima deve ter ouvido a comemoração. Mas então emudeci, sem saber o que responder; não por falta de vontade, pois aquele convite era tudo o que eu mais esperava, mas por timidez exacerbada, uma marca que carregava comigo desde a depressão. Por este motivo o convite não havia sido remetido por mim e, agora, aquelas palavras soavam como um desafio para minha personalidade 'arisca'. Se não aceitar, a perco de vez -sem, no entanto, tê-la, de fato, conquistado, mas, se aceitar, terei que domar esta timidez confusa, este medo de encontros, esta força quase mais forte que eu mesmo. Fechei a janela do site e acendi um cigarro para pensar...
Então, depois de muito refletir e ponderar sobre muito e tão pouco, respondi-lhe com a certeza de um bárbaro gladiador cercado de milhares de olhos aflitos no Coliseu, esperando que aquele brutal homem dê fim ao perdedor, ao derrotado, ao que lutou demais e conseguia, naquele momento, o de menos. Respirei fundo e disse-lhe que sim! Afinal, era apenas um encontro, coisa pouca, nada que pudesse colocar fim ao mundo, ao meu mundo. Contente com minha decisão acertada entristeci-me com imprevistos -que hoje, já nem lembro quais eram - que me fizeram adiar poder olhar naqueles olhos tão belos. Mas propus um novo encontro, agora com a certeza do Pilatos que lavou as mãos diante de Cristo, e ela aceitou, disse estar tudo bem. Mas, como iríamos nos encontrar com alunos dela -sim, ela era professora universitária - julguei melhor deixar para uma próxima vez, deixando que minha timidez guiasse minhas respostas, cometendo um erro cruel que poderia comprometer definitivamente o meu encontro com ela. Afinal, quem, depois de tantos desencontros, quereria ainda encontrar-se com um desconhecido que parece fugir de encontros como um vampiro corre da luz?
Era quinta-feira quando ela, novamente e com paciência e determinação quase religiosos, chamou-me novamente para um encontro, agora no domingo; Ariano Suassuna, ícone da cultura brasileira, palestraria em Taguatinga pela noite, finzinho da tarde. E, como quem diz em entrelinhas 'agora você não me escapa', ofereceu-se para dar-me carona da minha casa, em Águas Claras, até o evento. Aceitei, apesar do frio na barriga (!), trocamos telefones e aguardei até o domingo, que prometia ter uma tarde agradabilíssima.
Então, na noite de sábado, encontramo-nos no tal site de relacionamentos onde tudo começou, e conversamos muito! Rimos, tocamos em assuntos sérios, trocamos breves elogios e, a partir de determinado ponto da conversa, percebi que havia um declínio para algo mais forte que uma simples amizade. Entrelinhas e 'verdes' jogados se mostrando mais e mais convincentes; uma madrugada toda regada a uma conversa agradabilíssima que enclausurara o sono numa dimensão distante, longe daquele momento de descoberta, do primeiro 'conhecer' do outro. Depois de mais de 20 páginas de recados, deixando de lado alguns poucos que eu havia começado a apagar de antemão, o sono bateu do lado de lá; ela ainda estudaria naquele dia, era melhor descansar. "Beijos, boa noite, durma bem. Vemo-nos daqui a pouco”.
Por volta das 16 horas eu me impacientava! "Será que ela vem? Será que me achou um porre? Desistiu? Jamais irá querer olhar-me nos olhos depois da nossa tão agradável conversa boêmia?". O celular ao meu lado não tocava, achei 'fora do tom' ligar, como se estivesse desesperado atrás de uma mulher. Talvez ela não me entendesse. Enquanto assistia Tv, preocupado com a demora daquela mulher, pensava em como agir, planejando quais palavras falar, que termos usar para não parecer idiota. "E se ela tocar em assuntos da nossa conversa anterior pela Internet?" Tentei relaxar enquanto acendia um cigarro e olhava o horizonte, imaginando como seria estar com aquela mulher que despertava algo em mim, como jamais imaginei sentir em minhas veias.
O telefone toca! Pulo de susto e corro ao seu alcance e, meio trêmulo, sem saber o que ouviria, cumprimentei-a. Estava perdida em Águas Claras!! Rimos da situação, ajudei-a no caminho correto e aguardei ansioso os menos de 2 minutos passarem.
O telefone toca! Mas, agora, já não pulo mais de susto: minhas mãos tremem, ela avisa-me que me aguarda em baixo do prédio, da minha "torre". Indaguei sobre seu "cavalo branco", ela o descreveu. Desci, sentindo uma sensação gostosa e confusa.
A caminho do seu carro, numa fração de segundo pensei em como cumprimentá-la, o que dizer de início. Mas, para a minha surpresa, vejo uma mulher vindo ao meu encontro enquanto meu coração quase saia pela boca (!). Linda!! Maravilhosa!! Meu deus!! Aqueles cabelos cacheados soltos ao vento, um corpo escultural dentro de um vestido longo. Seu sorriso, tão belo, obrigou-me a fazer uma pergunta em silêncio para mim mesmo: "Eu estou conhecendo uma mulher dessas??? Meu deus..."
Abracei-a e entramos em seu carro, tendo como destino Taguatinga. O único detalhe é que ela, nem mesmo eu, sabíamos o local onde deveríamos chegar. Imaginei ser no SESI que tem a caminho de Brasília (Plano), mas não era. Depois de rodar e perguntar para algumas pessoas chegamos ao local determinado!! Como em Brasília as pessoas parecem verter do chão quando há algum evento gratuito, não pudemos entrar para assistir sentados, confortáveis. Rodamos as instalações do lugar, encontramo-nos com amigos daquela linda mulher, voltamos para o lado de fora para fumar um cigarro.
Ao lado dela uma vontade foi crescendo, solidificando, esvaindo em forma de suor frio: eu queria muito beijá-la, pegar sua mão, abraçar seu corpo, envolvê-la em meus braços; mas a timidez e a incerteza do desconhecimento da sua reação fizeram com que meu desejo continuasse sendo um simples desejo sem ação. Conversamos, encontramos alunos dela, tomamos algumas cervejas... Até que decidimos sair à caça de algum lugar para conversarmos melhor, tomando uma boa cerveja gelada.
NADA ABERTO EM PLENA NOITE DE DOMINGO!!! Queríamos um mísero lugar para nos sentar e tomar algo, nada de mais!! Rodamos um pouco e, quando as esperanças já estavam nos seus últimos suspiros, algo aberto!! Sentamos e começamos a conversar.
Falei sobre mim, sobre minha vida, revelei coisas que, por deus, não revelaria para uma pessoa que acabara de conhecer. Por um instante me perguntei: "ela deve estar cheia das minhas histórias tristes!! Vou calar a boca, perguntar sobre ela e me calar." Então, ela começou a falar sobre sua vida, suas frustrações, e descobri muita coisa em comum com aquela amável mulher a minha frente. O bar já fechava, então pagamos a conta e fomos para o Guará, onde encontramos um outro ponto aberto, embora estivesse quase fechando também. Conversamos mais uns poucos trinta minutos e voltamos. Era tarde, ela trabalharia na segunda-feira, decidimos voltar embora.
Todo o caminho de volta foi regido por uma dúvida silenciosa em minha cabeça. Devo ou não beijá-la? Se beijar, pode parecer que sou um galinha, que, mal conhece uma garota e já a agarra; por outro lado, posso desperdiçar uma chance única, pode ela estar querendo um beijo e eu, por timidez, não o daria. No impasse permaneci até chegarmos ao meu prédio. O carro parou, brinquei com algo sem sentido no momento e inclinei-me para abraçar-lhe, sentindo meu coração quase me induzir a um infarto!! Foi um abraço tão gostoso, uma noite tão gostosa... Agradeci pela oportunidade e, no fim do abraço, tomei coragem -na verdade, não sei de onde veio tamanha coragem naquele momento - e, lentamente, como nos filmes de cinema, alcancei seu rosto tão lindo e senti seus lábios enquanto tentava imaginar qual seria a sua reação. Para minha alegria e surpresa, aquela mulher bela, de lindos e cacheados cabelos, correspondeu ao beijo. O passado e o futuro perderam completamente seus sentidos e restou apenas aquele momento mágico, onde o tempo recusava-se a passar, onde nós, recém conhecidos, desfrutávamos do beijo mais gostoso que poderia existir. Afaguei seu rosto de pele tão sedosa; sentir sua respiração quente e ritmada era uma dádiva qual eu quase desconfiava ser real. "Estou sonhando?" Não, não sonhei naquele momento, embora tenha sentido que meu corpo todo se enchia de uma serena vontade daquele beijo não acabar mais, não precisar acabar. Meio sem jeito, despedimo-nos e ela se foi em seu "cavalo branco", enquanto eu fumava um cigarro na garagem do prédio, sentindo algo que fazia tempo eu não sentia.
Aquela linda mulher mexeu comigo desde o primeiro instante que a vira.
10 abril, 2007
Como tudo aconteceu
terça-feira, abril 10, 2007
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